domingo, 31 de março de 2013

A Páscoa cristã e os costumes pagãos

É entre março e abril: primavera no hemisfério norte. Chega a aurora dourando o céu bem devagarzinho e despertado as criaturinhas do prado, como que para não assustá-las, tal qual uma mãe generosa. A neve e o gelo começam a dissolver-se aos primeiros raios do sol e gotículas de orvalho passam a refrescar suavemente o ar matinal, fazendo ressurgir a vida que se mantinha dormente. Lebres saem de suas tocas e correm, sorrateiramente, por entre os arbustos. Na árvore, mamãe e papai passarinho trazem pequenos ramos e insetos para alimentar os filhotes que há poucos dias picaram seus ovos e libertaram-se para o primeiro amanhecer. Logo mais, surgem camponeses coletando o orvalho e banhando-se ritualisticamente, pois todas essas bênçãos são trazidas por Eostre, Deusa da Ressurreição e da Fertilidade. As crianças já estão ansiosas para a caça aos ovos coloridos trazidos pela lebre, mensageira da Deusa. Sim, ela certamente os havia trazido, pois sua sombra já se projeta sobre a lua cheia!
Assim era a tradição dos pagãos: em plena harmonia com a Natureza, a Deusa-Mãe que gentilmente os sustentava com suas dádivas. Eostre ou Ostara  tem origem, anglo-saxã, nórdica e germânica. O nome origina a palavra Páscoa em inglês (Easter) e alemão (Ostern) e deriva de ostar que expressa a ideia de sol nascente. Sua história se perde no tempo, e mescla-se com Deusas de culturas diferentes.

E as crianças continuam percorrendo os campos em busca dos ovos. Mais a frente encontram outro grupo a brincar. Os dois lados se aproximam e iniciam um diálogo:

— Salve! Que belo dia hoje! Que estais fazendo por aqui?

— Estamos comemorando a Páscoa de Nosso Deus e Senhor!

— Páscoa?

— Sim, Nosso Senhor Jesus Cristo morreu numa cruz por nós. Porém ao terceiro dia Ele ressuscitou.
Todo aquele que Nele crer, também ressuscitará e passará da morte para a vida. Páscoa quer dizer justamente passagem.

— Ah! Então, quer dizer que vocês são cristãos?! Muito ouvimos falar a vosso respeito. Que curioso! Também nós estamos celebrando a chegada de nossa Deusa Eostre, que se ausenta durante o inverno e trás de volta a vida quando a primavera chega. Ela é nossa Deusa da Ressurreição. Sua lebre, criatura fecunda, nos traz os ovos dos quais surgem nova vida. Vejam, encontramos um!

— Que lindo! Sabem que quando o Cristo ressuscitou, Ele irrompeu a pedra do sepulcro tal qual um pintainho picota a casca do ovo ao nascer?

— É verdade? Vamos encontrar alguns ovos para vos presentear! Eostre gosta muito das crianças...

— Jesus, da mesma maneira, sempre gostou de crianças e dizia que quem não tivesse um coração como o nosso não entraria no Reino dos Céus. Vejamos se temos algo para também vos presentear. Sim, temos alguns pães-doces que nossas mães prepararam para a festa.

E, assim, as crianças voltaram para suas casas com o coração cheio de felicidade por terem feito novos amiguinhos.

A partir do contato com culturas diferentes, o cristianismo assimilou alguns de seus costumes. A tradição dos ovos de Páscoa e da lebre, hoje confundida com o coelho, foi muito difundida nos países europeus, principalmente na Alemanha, espalhando-se pelo resto do mundo. Com o tempo, os ovos de galinha pintados deram lugar aos de chocolate.

A todos uma Feliz Páscoa!

segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Um Natal reciclado


Este foi um ano promissor para Osvaldo e sua esposa Amélia. Foram convidados a fazer parte de uma cooperativa de coleta seletiva de lixo. Aprenderam muito sobre a importância da reciclagem do lixo para o planeta e de como incorporar tudo isso a sua própria economia. Passaram a usar muitas coisas feitas de material reciclado e até mesmo a comercializar alguns utensílios. Era só soltar a imaginação e surgiam vasos, blocos de papel reciclado, diversos tipos de brinquedos. Com isso a renda familiar passou a ter um aumento significativo.
Finalmente terão uma farta ceia de Natal. Imaginem que haverá até peru e tênder! A árvore de Natal ficou linda, toda ela também feita com material reciclado! Os pais apenas lamentam não ter conseguido comprar a bicicleta para Marquinhos. Dar-lhe-iam outro presente.
A noite do dia 24 enfim chega e o casal passa a receber os convidados: vêm alguns parentes e amigos da cooperativa. Amélia está usando um belo vestido vermelho e Osvaldo e Marquinhos camisas e calças sociais. O menino tem a honra de acender a iluminação da bela árvore acionando uma chave. Todos aplaudem.
Quase à hora da ceia batem à porta. Osvaldo vai ver quem é: trata-se de um mendigo em busca de alguma comida e de um lugar para se esconder da típica chuva das noites de verão. O homem resolve convidá-lo a entrar. Trata-se de um senhor já de barba e cabelos brancos trajando uma roupa simples, porém limpa. Ele, então se une aos demais. Antes da ceia fazem um momento de silêncio acompanhado por orações seguidas de votos de um Feliz Natal. Todos degustam a ceia. A mesa é farta e há também frutas, figos da Índia e pêssego em caldas servido com pratos salgados.  
Depois fazem a revelação do amigo secreto onde se trocam presentes. Todos riem e se divertem bastante com a brincadeira. Com o passar do tempo as pessoas se despedem cumprimentando o casal. Apenas o mendigo se foi misteriosamente.
Ao amanhecer do dia, bem cedinho para um caminhão em frente à casa da família. Batem à porta e trazem uma encomenda. Uma caixa acompanhada por um cartão da cooperativa: trata-se da tão sonhada bicicleta de Marquinhos! O menino e os pais ficaram muitíssimo felizes. Haviam ganho o prêmio de melhores cooperados do ano!
Um Feliz Natal e um Próspero Ano Novo a todos!

sábado, 17 de novembro de 2012

Dédalo e Ícaro


Logo após Teseu matar o Minotauro, Dédalo e seu filho Ícaro são aprisionados numa torre por ordens do rei Minos, pois este descobrira a traição do engenhoso arquiteto em construir uma vaca de madeira para que a rainha ficasse em seu interior e copulasse com o touro branco, gerando assim, o terrível monstro meio homem, meio touro.
Com o passar do tempo, Dédalo passa a juntar penas de gaivotas e com estas unidas entre si com cera de abelha cria seu mais novo invento: asas mecânicas. Planeja fugir da ilha de Creta usando as mesmas. Passa a explicar ao filho como o equipamento funciona:
— Elas são presas ao corpo por meio destas correias. Usamos os braços para fazê-las entrar em funcionamento assim como os pássaros a bater as asas. Saltaremos pelas janelas da torre, cruzaremos o mar e pousaremos então em terra firme. No entanto há um detalhe muito importante. Não poderemos voar muito alto para que o sol não derreta a cera, nem muito baixo para que as penas não se encharquem com as águas e fiquem pesadas demais.
Iniciariam a jornada logo no dia seguinte. Chega a hora de testarem o fabuloso engenho e os dois mergulham das janelas, dão um voo rasante e começam a subir. Podem sentir o vento batendo em suas faces com o inebriante cheiro de maresia. Passam a sentir a liberdade desejada desde o primórdio dos tempos por todo o ser humano. Opa! Algo começa a sair do planejado! Ícaro fica deslumbrado por tudo aquilo e passa a subir além dos limites estabelecidos. O sol passa a esquentar cada vez mais as asas e, a cera começa a derreter, as penas passam a se soltar e o jovem cai e se afoga nas águas do mar Egeu. Ao longe Dédalo vê um aglomerado de penas sobre as ondas: tarde demais...
Na vida devemos sempre buscar nossos sonhos, vivendo dentro dos nossos limites, nem acima nem abaixo do nosso potencial. Devemos sempre voar “no linear do horizonte humano”!

 

sábado, 10 de novembro de 2012

Oficina de aquarela

Estávamos reunidos na sala de TO enquanto Valquíria passava-nos as primeiras instruções a respeito da oficina de aquarela. Pegamos o papel canson e o mergulhamos numa bandeja com água. Era a primeira vez que eu mexia com aquela tinta. Retiramos o papel totalmente encharcado e começamos a trabalhar sobre o mesmo aplicando a tinta da maneira que a nossa imaginação mandasse. A aquarela fluía sobre a água como uma folha a seguir seu curso no leito de um rio, tais quais nossas emoções a aflorarem por sob a pele e invadirem a sala. Surgiam desenhos dos mais variados: árvores, nuvens no céu, cavalos em disparada pelos prados floridos. Eu fazia a figura de Dom Quixote combatendo moinhos de vento. Sempre gostei dessa cena. E a água tentando dar um rumo diferente ao fluxo de tinta pincelada sobre o papel...
— Isso é o mais interessante da aquarela — dizia a Terapeuta Ocupacional — as figuras não saem exatamente como nós desejamos: a água cria efeitos inesperados.
Não imaginava que a aquarela fosse assim, viesse em tubo e que o trabalho fosse feito sobre um papel molhado. Conhecia apenas aquela aquarela da Hering. Quem não se lembra? Vinha num papelão imitando uma paleta onde as cores eram pastilhas que molhávamos com o pincel.
Então passei a prestar atenção na letra da música do Toquinho. Aquarela é uma alusão à vida onde ele solta sua imaginação cria castelos, barcos, aviões, aves e está cercado pelos amigos e, enfim, pinta o mundo, e tanto uma coisa quanto a outra, a aquarela e a vida, são instáveis. Construímos nosso destino em partes, mas estamos sempre entregues ao fluir das águas do tempo, que é senhor de tudo, e devemos seguir o seu curso inexorável.
“E o futuro é uma astronave / que tentamos pilotar / não tem tempo nem piedade / nem tem hora de chegar / sem pedir licença muda nossa vida / e depois convida a rir ou chorar.”
E na oficina os desenhos começavam a ficar prontos e eram postos para secar, enquanto Valquíria fazia suas considerações finais. No dia seguinte fizemos uma exposição dos mesmos nas paredes do Hospital Dia de Psiquiatria da UNESP de Botucatu.

sábado, 3 de novembro de 2012

Enviando e-mails

No cabeçalho dos e-mails há três campos de endereçamento:
para, cc (cópia carbono) e cco (cópia carbono oculta). Vejamos para o que servem cada um deles.
O primeiro campo: para, preenchemos com o endereço do destinatário principal da mensagem. Em cc colocamos os e-mails das pessoas que devam estar a par da mesma, geralmente tratando-se de um assunto profissional.
Quando você for enviar mensagens para vários contatos, principalmente não sendo um assunto profissional, é aconselhável usar o campo cco, ou, em inglês, bcc. O mesmo possibilita que os destinatários não saibam os endereços de e-mail uns dos outros sendo a maneira mais ética e segura de se enviar e-mails. Evitaremos criar listas enormes de endereços de e-mails, pois elas acabam se tornando um prato cheio para hackers e spammers que se utilizam das mesmas para enviar aquelas propagandas não autorizadas que volta e meia recebemos, possibilitando também uma alta propagação de vírus pela rede.
É muito útil ainda apagarmos todo o “lixo virtual”, que consiste no endereço de quem nos enviou uma mensagem, ao encaminhá-la a outros. Senão acabaremos criando outra lista enorme de e-mails. Agindo assim estaremos acabando com grande número de vírus, tornando a web um ambiente mais seguro.

quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Amargura do fel, doçura do néctar

Após nove meses
Enfim chega o dia.
Gemido ensurdecedor
Surgem lágrimas de dor
Precedendo as de alegria.

Céu se fecha em tempestade,
Alma se encerra em tristeza,
Porém quando a chuva cessa traz fecundidade,
Com o brilho do sol, a beleza.*

Já diz o ourives que trabalha
O metal em fogo ardente
Que quanto mais tempera o aço que talha
Mais ele se torna resistente.

Na ramagem espinhosa
A subida é dolorida,
Mas infindável é o prazer
De beber o néctar da rosa da vida.


*Com o brilho do sol (traz), a beleza.

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

O confronto


Eis que me embrenhava por floresta densamente fechada pela vegetação. As copas das grandes árvores impediam a passagem da luz e os cipós dificultavam o caminho. Estranhos ruídos provocavam-me calafrios. Medo, muito medo! Andava às cegas, guiado pelo instinto que me mostrava o caminho. Porém, uma estranha fera confundia-me para que eu jamais chegasse ao meu destino. Dizia-me coisas incompreensíveis que me chegavam ao íntimo sem passarem pelos meus ouvidos. Fazia-me temê-la tanto que chegava a tê-la como verdadeira amiga, protetora, minha guardiã. Fazia com que me prostrasse diante dela e a adorasse. Por muitas vezes, eu me libertava continuando o meu percurso. Um momento de intensa alegria... Eu estava vendo a luz... finalmente a luz! Decepção. Era outra ilusão provocada pela fera. Essa falsa luz, ao invés de permitir que eu enxergasse, ofuscava-me a visão. E por muitas vezes isso tem se sucedido. Um dia, andando pela escuridão e novamente guiado pelo instinto, vi ao longe uma claridade. Segui incessantemente naquela direção e cheguei a uma deslumbrante clareira. Brilhava um imenso sol que iluminava sem que a vista se cansasse. Havia rochas das quais minavam águas cristalinas e vivificantes. Era um lugar esquecido pelo tempo; apaziguador. Já não sentia mais o peso do corpo. Tinha apenas sede, aquela sede que parecia durar milênios. Dirigia-me à fonte quando, de repente, ouvi acima de minha cabeça, numa árvore, um ruído. Olhei e vi a fera: uma grande pantera negra mirando-me com seu olhar magnético. Saltou em minha frente e caiu sobre dois pés. Ali estava eu, frente a frente comigo. Eu estava vestindo uma túnica branca e resplandecente. Ele trajava uma túnica negra. Tentava impedir minha passagem mas, na luz eu era bem mais forte. Levou a mão à cintura e sacou sua espada. Fiz o mesmo, nem sei como. Começamos a lutar. Sabia de antemão todos os golpes que eu iria aplicar e contra-atacava-os. Porém, quanto mais eu permanecia na luz, mais consciente tornava-me e aprendia a conhecer minha face oculta. Ele, aos poucos, tornava-se transparente e ao tocá-lo com minha espada, desapareceu por completo. Afinal, havia vencido meu inimigo. Agora, iria tomar daquela água para que pudesse viver. Tudo em paz. Sentei-me à beira do riacho. O dia estava lindo e os pássaros cantavam. Quando me abaixei para beber, percebi que a água estava podre e cheirava muito mal. Um córrego estava sujando-a. Levantei-me e ao virar, me assustei dando de cara comigo novamente.
— Não! — gritei — O que você quer de mim?
Ele sorriu.
— Não beba dessa água! Do contrário morrerá! Não há saída! De nada lhe valerá a luz sem a água. Venha fundir-se a mim.
Eu já estava cansado, com muita sede e enfraquecendo.
— Você não me venceu. — disse ele.
Uma espessa camada de nuvens cobriu o céu impedindo a passagem da luz. O dia se fez noite. Ele caiu de quatro tornando-se pantera. Olhou-me e rugiu. Saí correndo e entrei novamente na mata sendo perseguido.